quarta-feira, 7 de julho de 2010

Lembranças que o tempo não varre

A Lua Crescente me espia solitária pelas frestas da janela velando meu sono inquieto. Debruçada na janela do meu quarto me sorri um sorriso delgado, deixando escapar um fio de luz tremeluzente que atravessa as frestas da janela caminhando trôpega no ar até encontrar a cama, deitando-se nela junto ao corpo meu. A Lua aconchega-se nos braços da noite, recostando-se no manto negro que se desenrolou cobrindo o céu com negrume. Céu negro, estrelas dispersas e meia-Lua. Uma xícara de café com gotículas de leite e ao lado uma rosquinha de coco pela metade disposto naquela mesa gigante para alguém deliciar-se. Um sopro adentra pela janela agora entreaberta, fazendo dançar as cortinas, para que o quarto respire a noite lá fora. O sopro sussurra brisa ao pé do ouvido. E eu ouço a canção silenciosa da noite dedilhada em mim. O relógio tiquetaqueando versos de tempo. Eu tento digladiar a insônia vestida com minha armadura de lençol. Uma nuvem cinza encobre a Lua, fazendo-se a noite, levemente prateada, escuridão. E a escuridão pincela abismos nas paredes do meu quarto. A ausência desenha solidão cá dentro. Meus pensamentos tagarelam com o travesseiro. A cama fica apequenada para um corpo que não quer ficar, para um corpo que deseja liberdade. E as paredes do meu quarto me sufocam, o concreto me esmaga. Uma lembrança tua faz cócegas na memória fazendo sorrir no coração uma saudade. Quando pensei que tu há muito adormeceras dentro de mim tu, outra vez, acordas esperto. E eu levanto com o peito gargalhando saudade. O meu antiquário de lembranças abre-se, esvoaçando recordações, num redemoinho de lembranças eu mergulho. E o meu antiquário conserva as lembranças mais antigas, sem nenhum arranhão, nenhuma delas está quebrada, nenhuma delas o tempo empoeirou ou desbotou. Lembranças que o tempo não tocou com aspereza ou esquecimento.
E eu submersa nessas lembranças deixo a noite embalar-me em sua musicalidade, sonolenta eu adormeço embrulhada em lembranças tuas. Amanhã é novo dia talvez outras lembranças venham me visitar, e que eu não esqueça que elas não se esquecem de ser lembradas. Lembrança é um passado acontecendo hoje e amanhã e sempre porque lembrança nenhuma o tempo arranca, elas ficam enraizadas na memória e vez em quando florescem no coração. Lembrança nenhuma, mesmo leve, o tempo não leva... Lembranças que o tempo não varre, não arrasta.
E tu certamente acordarás outra vez dentro de mim. Tu não adormeces.